20090723

Titia Kindora




Na minha opinião existem poucos blogs que valem a pena. Assim como existem poucas pessoas que escrevem de maneira envolvente. Eu, por exemplo, escrevo basicamente de uma maneira escrachada, rápida, fácil e prática, sendo assim, não é algo muito envolvente. Eu diria até que escrevo somente por um motivo: TIRAR O CHEIRO DE PUM DE DENTRO DA CABEÇA.

Mas existem pessoas que possuem o dom da escrita vidrante. Eis aqui um exemplo:
(Leia escutando The Kooks. Dá um bom resultado)

De onde estou o caminho é curto e bom para chegar ao centro das operações inusitadas da cidade e, fosse você, sairia de onde está para passar por lá também, seja pelo motivo que for ou simples desculpa ou curiosidade – prestando atenção às minuciosidades, pois dá acesso ao resto da cidade e de lá partem e chegam ônibus, carros, negociações, novidades e pessoas.
Em qualquer dia da semana, ignorando a distância de 149.597.870.691 km, ou seja, uma unidade atômica, do sol sobre o humano julho, homens e mulheres tão próximos do chão, ardendo em seus endurecimentos caminham obedientes às coisas razoáveis.
E com se tudo estivesse atrasado, os ônibus sopravam poeira asfáltica nos sapatos e os carregavam numa mesma serena e violenta harmonia, a vida se tornando bela aos incompreensíveis olhos de homens e mulheres, raros cachorros de rua, muitos pombos e a praça da matriz. No modo das coisas vivas.
O hálito se confundia com os gases baforados por bocas, escapamentos e pensamentos fugidios – escapando-se como se vivessem o último dia, lançando-se incólumes a estação, compilando a realidade do mundo palpável.
Alguns se prolongam ali, alguns sobrevivem, outros se sucateiam, sentados nos bancos da praça, nos pontos, nas esquinas, rodapés rodopiando também suas desventuras e casos. O movimento perfeito: o amor, a angústia, a ferocidade, a piedade, a admiração, a tristeza, o orgulho, a indiferença e a oscilação humana; nunca tão presentes como naquele lugar, embebedados de compromissos, arrastados pelos pés, descobrindo a pólvora cronológica dos relógios. Vão se escondendo, um a um em suas cortinas, nos uniformes, nas pastas. Permanecer ali atento é como ter um leiômetro das coisas simples e complexas todas numa só.
As mulheres dançam o balé dos saltos encravados no chão ou sobre plataformas desestabilizantes, enquanto os homens pisam o chão em seus falsos couros e borrachas coreanas. Pisam com o pé, o pé que pisa o chão alcança a própria liberdade dos pés? Não importa, cada homem, cada mulher, assim como os cães, pombos, semáforos, lanches, bancos, roletas criam a sua própria identidade na matriz dos seus anseios.
São a sua própria chance. É o mais importante a fazer numa terra de homens.
O sol já não arriscava o momento, então o resto de prudência caiu transformando a cadeia de concreto e carne, pairando no ar a conseqüência de se armazenar em si mesmos (maltratando o silêncio). Já não eram, todos, os mesmos do sol. Se rebentariam agora, essa nova leva de passos, no escurecimento do dia, brilhando seus olhos sob os faróis, concentrando-se nas sandálias, espalhando-se sem pedir permissão, na pausa para o avanço nos pontos de ônibus ou descarregando sua vastidão… As prestações, o cinto de prata e a blusa de bicho, o salto desconforme e as pernas em balanço, as calças de malha em corpos desprovidos de formas, a sutileza dos cabelos e o arranhão na sobrancelha, as unhas raspadas, a comida no chão, as prestações de si mesmos no arco do fim do dia.
Era a urgência tranqüila, o gosto do nada na boca e a legitimidade tentadora de cada um. Isso altera e recomeça todos os dias como se o mundo fosse um lugar só, onde a exaltação do dia é a ressaca da noite que engole o dia, exaltando-se.
O tempo passava, passavam os pés, as vassouras varriam o antigo cinema e os salões de bailes memoráveis instalados ali, os edifícios históricos inexpressivos de agora, bem como o cenário diário, o caminhão recolhia os escombros e tudo o que parecera pronto esvaziava-se, deixando a praça nua para logo existir.
Os jornais empacotavam os prédios memoráveis do centro, os luminosos ocultavam as janelas e a cidade adormecia.
**lugullar**


Tia Luciana sabe o que faz, né não ?

Sempre que posso, dou uma passada nos blogs dela:


Vale a pena.

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